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9.8.03

Incêndios (parte 1)
A terrinha da minha adoração é uma pequena aldeia que fica no centro de Portugal, algures na Beira Baixa.
Algarve, uma ova, antigamente eram sempre lá as minhas férias de Verão.
Uma vez, aqui há uns anos, acordei de manhã com o sino da igreja em aflito rebate - eram as courelas de pinheiros à volta da terra que ardiam.
O povo, todo, tratou logo de combater o incêndio como pôde, moto-serras, enxadas, ramos de pinheiro, etc.
Eu e o meu avô paterno também fomos ajudar, mas a certa altura deixei de o ver. Não passou meia hora, vieram avisar-me que tinha ficado cercado pelas chamas, lá junto a umas terras que eram dele e do irmão...
Por sorte, o local era rochoso: correndo pela parte já queimada conseguiu subir a um penedo e de lá, passar para uma zona ainda não ardida de onde puderam chegar-lhe e levá-lo de urgência para o hospital. Não que as chamas lhe tivessem pegado, mas o calor tinha sido tanto que lhe deixara queimaduras no rosto, peito e mãos.
O incêndio continuou imparável. Ao meio da tarde, chegou junto à aldeia ameaçando as casas. As mais desesperadas eram a casa dos meus avós e a duma tia do meu pai.
Nas traseiras das duas casas, havia um perigoso palheiro cheio de palha, propriedade dum vizinho e uma encosta repleta de pinheiros e mato que começava a arder.
Tiraram-se os porcos das pocilgas, para que se salvassem.
Entretanto, apareceu ali imenso povo para defender as casas e também um carro dos Bombeiros. A derradeira esperança era um caminho de acesso, paralelo às duas casas, distante uns 20 metros. Havia que evitar a todo o custo, que o lume atravessasse esse caminho e incendiasse os pinheiros da parte de cima. Enfim, mandando água e cortando alguns pinheiros, conseguiu-se que somente tivessem ardido os da parte de baixo e lá se acabou por conseguir salvar as habitações à tangente, quase por milagre.

P.S.
1. Devido aos ferimentos, meu avô ficou hospitalizado 30 dias, durante os quais não pôde beber vinho, apesar de um enfermeiro lhe ter descoberto uma garrafa debaixo da cama. Após receber alta, continuou os tratamentos em casa. Ficou com grandes cicatrizes nas mãos e também dores, de que se queixou até ao resto da vida. Morreu com 93 anos.

2. Depois deste incêndio grande, sem contar com os sustos, já sucederam mais 2 fogos junto à povoação, numa média de 1 grande incêndio por cada 10 anos. O último, foi este domingo passado.
Já se perderam largos milhares de contos, mas ainda não foi desta que o fogo destruiu a aldeia. Não se fazem aceiros, e os pinheiros continuam junto às casas, prolongando a floresta até elas.
Tá-se bem !

Incêndios 2
Perante as notícias que chegavam sobre os fogos, "saltou-se-me a tampa" e fiz-me ao caminho, depois do almoço, rumo à terrinha.
Em Montargil, já a viagem ia em 1 hora e meia, de repente o carro começa-me aos soluços, até que o motor se vai abaixo e fico parado, mesmo em frente ao Hotel Barragem. Olho para os ponteiros do tablier: tudo normal. Respiro fundo e dou à chave da ignição com pouca fé...
Para minha surpresa, o motor volta a trabalhar. Recomecei o andamento, mas sempre à espera de novo falhanço do motor, um que me deixasse parado de vez.
Chegado à Ponte de Sôr, nos arredores, parei para ver o motor. Sei lá, não percebo nada de mecânica, mas pronto...
Obviamente não descobri nada, voltei a sentar-me ao volante: o motor pegou outra vez, logo à primeira. Arrisquei continuar.
No alto da Bemposta, vi os primeiros sinais de fogo. Uma grossa coluna de fumo elevava-se ao longe. Onde seria aquilo, Gavião ? Não sei...
Passei pela terra do Professor Manoel Rodrigues e logo a seguir, do lado esquerdo da estrada, oliveiras ainda fumegantes. Mais à frente, eucaliptos e sobreiros também.
Um fábrica de torrefacção de café e outra de cortiça tinham conseguido escapar às chamas, felizmente.
Em Rossio ao sul do Tejo, um enorme manto de fumo envolvia a cidade de Abrantes. Atravessei a ponte sobre o Tejo, no sentido Sul-Norte. À minha esquerda, a margem sul, que é íngreme, ardia.
Segui para o lado de Alferrarede. A seguir ao Olho de Boi, entrei na A23. Passado um instante, acabado de ultrapassar um camião, volta a falhar-me o carro: soluços e perda de potência. Achei perigoso prosseguir na auto-estrada, saí nas Mouriscas.
O carro parecia portar-se sem problemas a baixa velocidade, então iria pela estrada velha, pelas famosas curvas.
Tal como previa, andando devagar não voltei a ter problemas até casa dos meus pais.
(continua)

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